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Crônica: O futuro é logo ali (Por Rômulo Rossy Leal Carvalho)

Só há independência quando nós, em nossos próprios valores, nos concebemos independentes: pelo nosso estudo, trabalho, dedicação e, aos que crêem, fé.

Por Rômulo Rossy Leal Carvalho

201 anos de independência

O átrio da Matriz da Igreja de Nossa Senhora da Conceição ficou pequeno diante da imensidão de talento, trabalho e entusiasmo na última noite deste dia 07 de setembro de 2023, com as apresentações de alunos e alunas – capitaneados por mestres e assistidos por um público ilustre – do Centro Educacional José Matheus Alencar Silva, de São Julião – PI.

Eventos dessa natureza, e que possuem envergadura tanto intelectual quanto laboral física (ambos juntos, a inteligência e o trabalho) demonstram o quão nosso país, ao se tornar independente em relação à Portugal, em 1822, como consta nos anais da história oficial, reúne prodígios dos mais diversos: desde a criança, o mais infante, até o jovem, que desenha seu futuro sem desvencilhar seus pés do presente e as inquietações que ele descerra.

Discentes, docentes e equipe gestora do CEJMAS se reuniram em um só coração rememorando um acontecimento, às margens do riacho do Ipiranga, em São Paulo, admitido à ordem fática como o dia da independência do Brasil (muito tempo depois da ocorrência em si). Naquela época, Dom Pedro I, ao receber cartas da Corte (que ficava no Rio), e pelo clamor de uma população que, sim, estava pronta para ser livre, resolveu desobedecer às ordens do pai, Dom João VI, e permaneceu no país que, ainda hoje, tem, no seu caminho, muitos desafios – e eu diria que o maior deles é a sacramentação da justiça social por meio da educação de qualidade.

Saúde, saneamento básico, segurança, moradia, lazer (direitos constitucionais): todos esses elementos configuram e são configurados a partir das premissas do que chamamos de cidadania. Ela é um processo contínuo, portanto não é um fim em si mesma, e nem está finalizada. O sodalício de ontem mostrou, de forma bastante clara, isso: somos muitos povos em um só. Somos Brasis. O Brasil, que já foi indígena e que continua tendo seus povos espoliados, e e em luta. O Brasil dos povos escravizados de diversos países da África, berço da humanidade. O Brasil português, que herdou tradições religiosas, que se fundiram com outras tantas manifestações que se materializam na forma como nós, hoje, nos relacionamos uns com os outros.

Um adendo especial seja dado aos semblantes de cada criança ali se apresentando. Elas estão começando a costurar – e que isso se consolide cada vez mais – uma ideia de civismo: respeito à pátria vai além da postura; é, antes, pois, um exercício desta aliada à empatia, alteridade e disciplina. A rigor, o patriota, que ama o Brasil, procurará sempre o seu bem, e este mesmo (o que se pode fazer pelo país) que se faça a seus compatriotas. Até pode ser anotada aqui uma alusão à crença judaico-cristã, que compreende uma cifra demográfica de mais de 80% da população brasileira: só se ama a Deus, se se amar o próximo. Dito isto, amar o Brasil, patrioticamente, é também amar seus patrícios, isto é, seus povos.

Aludo às crianças porque elas têm esse estímulo e o têm visto ser elaborado a partir dos muitos esforços empreendidos pela (sua/nossa) equipe do CEJMAS. Só há independência quando nós, em nossos próprios valores, nos concebemos independentes: pelo nosso estudo, trabalho, dedicação e, aos que crêem, fé. Fé não só religiosa, mas a fé do esperançar (como escreveu Paulo Freire) de que a autonomia se conquista a cada dia, com autoridade, e não autoritarismo.

Que este 07 de setembro, luminoso não só pelos adornos que agigantaram a frente da Eclesia, mas pelo brilho de cada participante e espectador, promova em nós a capacidade de entender que a história é um processo, e que as memórias acerca da Independência do Brasil (e por que não do nosso Piauí?) continuam sendo produzidas. Ninguém está só quando o outro reconhece sua necessidade de abraçar causas que são comuns – e a educação é uma causa, para que as consequências sejam justamente as que esperamos: frutos de ordem, progresso e liberdade à luz do princípio de que o meu direito termina quando começa o do outro. E que ninguém é independente ou feliz sozinho.

Se a esperança nos move e o trabalho nos impulsiona a prosseguir enfrentando cada percalço, as apresentações de ontem nos mostraram que o nosso futuro está logo ali, já começou e precisa ser construído, sobretudo, pela paz e não somente pelo “tolerare” (expressão latina que designa suportar, a ideia do tolerar), mas pelo respeito mútuo em suas amplas dimensões, sem deixar, jamais, de lado a bandeira anil do amor, a única que ninguém será capaz de esfacelar. Viva ao CEJMAS! Viva à Independência do Brasil!

Rômulo Rossy Leal Carvalho é professor (licenciado em História pela Universidade Federal do Piauí – Campus Senador Helvídio Nunes de Barros), mestrando em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e membro perpétuo da Academia de Letras do Vale do Riachão (ALVAR)
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