São Julião

Leia O Sertão e o Sertanejo, crônica do sãojuliãoense Wenderson Sá, vencedora do I Concurso de Crônica da ALERP 2023

Academia de Letras da Região de Picos – ALERP, divulgou no dia 30 de junho de 2023, o resultado do I Concurso de Crônica 2023 da instituição, na categoria Infantojuvenil e adulto.

Dois sãojuliãoenses foram destaques na categoria Infantojuvenil, ocupando o 1º e 3º lugares respectivamente. São eles, 1º Lugar: Wenderson da Silva Sá, com a crônica O Sertão e o Sertanejo. E Francisco Evandro de Sá, com a crônica Tempo Bonito. Vídeo abaixo!

O poeta e cronista, Francisco de Assis Sousa, atual presidente da ALERP, realizou a entrega da premiação aos vencedores.

Wenderson da Silva Sá e Francisco Evandro de Sá são primos e receberam como premiação da ALERP: troféu, kit de livros dos autores alerpianos e um livro (Antologia) com os textos classificados e os demais inscritos no concurso, que será publicado pela ALERP através do portal Clube de Autores.

Francisco de Assis Sousa, atual presidente da ALERP, realizou a entrega da premiação

Leia abaixo O Sertão e o Sertanejo, crônica de Wenderson da Silva Sá ganhadora do I Concurso de Crônica da ALERP 2023 na categoria Infantojuvenil.

O Sertão e o Sertanejo.

Entre pedregulhos, terra seca e vegetação espinhosa, característica de um clima seco, troca-se folhas por espinhos para diminuir a transpiração que gera a perda d´água durante o dia, fazendo da fraqueza a força, característica do pobre sertanejo na luta pela sobrevivência, sem a percepção de que o que realmente falta é uma melhor forma de adaptação.

Em meio à caatinga, estradas carroçais e veredas, vê-se a figura de um simples menino, vestindo seus trapos, pele queimada pelo sol, sola do pé grossa por andar na terra quente, baladeira no pescoço e borná cheio de pequenas pedras. Ali, logo ao ser interrogado sobre que está a fazer, reponde: “Estou caçando passarin: avoante, lambu, juriti…” (pássaros típicos do semiárido). Com entusiasmo, mostra o resultado da caçada, puxando do borná três pássaros abatidos, e diz com um brilho de empolgação no olhar: “Vou levar pra casa, pra mainha preparar com tapioca”. E começa a caminhar rumo a sua casa, a passos lentos, observador como o verdadeiro sertanejo é.

A casa do sertanejo, ao passar da curva, lembra a canção de Luiz Gonzaga e Zé Marcolino, “Numa sala de reboco”, ou também conhecida por casa de taipa, que é construída a partir de uma estrutura de madeira, principalmente de aroeira, madeira forte e resistente ao tempo, bastante comum naquele bioma. Depois é tecida com varas e o barro, e como diz o próprio poeta Zé Marcolino “o sertanejo mais caprichoso, como uma colher alisa o barro, assim o chamado reboco”.

Ao adentrar a casa do sertanejo, vê-se logo um tamborete de couro de tamanduá rasgado, tubos de zinco para a armazenamento da safra: feijão, milho, fava e outras hortaliças cultivadas no período chuvoso, guardado para o longo período de estiagem que pode deixar com fome aqueles que não se precaverem. Na parede, retratos de candidatos e calendários de políticos, imagens de santos, que representam a fé de um povo temente a Deus e seus guardiões que passaram aqui pela Terra, e armadores de rede, geralmente confeccionados com madeira de pau d´arcos, redes e preguiçosas de algodão filhado ou tucum, para o cochilo após o almoço, antes de mais uma tarde de muito trabalho. Potes de barro, copos de alumínio remendados com cera de arapuá, cambites de marmeleiros, fogões à lenha e sótãos de madeira, para a guardar alimentos, especiarias, ferramentas e tantos outros itens.

Mas ali, naquele cantinho ou corredor, mostra-se parte da cultura de um povo, diante da religiosidade do sertanejo, ali está o altar, seja feito na própria estrutura da casa, ou à parte, em um pequeno altar de cumaru, para abrigar objetos religiosos: imagens de santos, terços, rosários, crucifixos, velas e tantos outros. A dona de casa faz suas preces, rogando pela misericórdia de Deus, a proteção de sua família e o fim da perversa seca, outras vezes agradecendo pela farta colheita e pela saúde de seus entes. “Quando bate a seis horas, de joelhos sobre o chão, o sertanejo reza a sua oração”. A “Ave Maria Sertaneja”, canção toada de Luiz Gonzaga no rádio a pilha anuncia o fim do dia.

A noite sertaneja é linda por demais, no inverno, todos a contemplarem os relâmpagos e nevoeiros cortarem as serras, no verão, as estrelas e constelações vislumbradas em um céu limpo de nuvens e qualquer massa de ar. A lua tem diversos significados e lendas na cultura deste povo. “Não há, ó gente, ó não luar como esse do sertão” na voz de Gonzagão, com composição do maranhense Catulo da Paixão Cearense, relembra a saudade dos pé-de-serras do sertão, considerado pelo mestre Rolando Boldrin como a letra mais linda da extraordinária música sertaneja Brasileira.

Aqui, aculá, nas noites, o nordestino tem um dos seus poucos e simples luxos das horas vagas, o forró que traz muita alegria e diversão, principalmente no santo Antônio, São Pedro, São Gonçalo e São João, mas que não deixa de ser apreciado também em outras épocas do ano, fazendo a alegria de um povo animado, forte, feliz. Momento que ele se mostra estoico, esquecendo suas dificuldades e sofrimentos e cai no terreiro dançando, festejando e bebendo. O sanfoneiro e o trio pé-de-serra começam a tocar e o coração de moças e rapazes a trocar olhares, dançar e, escondido dos pais, onde a luz do candieiro e lampião não chega, namorar, dali sai filho, sai inté casamento.

Assim, se encerra e recomeçam dias e dias de labutas de uma população negligenciada, na parte mais esquecida do país por algumas esferas, deslembrada por políticos, reflexos da cultura do Coronelismo e outros tantos fatores que causam tanta alienação, mas que não os faz desistir, pelo contrário, torna-os resistentes, com garra para continuar a lutar, produzir, buscar conhecimento. Terra de grandes artistas, de belos patrimônios culturais, tradições que encantam, pessoas que acolhem, que carregam consigo marcas de sofrimento, mas que servem de combustível para o reconhecimento de quem realmente importa: do povo. Ciclos vão se passando e como diz, mais uma vez, o grande porta-voz do sertão, Luiz Gonzaga, na canção “Terra, vida e esperança”, ao som da agulha da radiola sobre os sucos do vinil “ser sertanejo senhor é fazer do fraco forte, carregar azar ou sorte, comparar vida com morte, é nascer nesse sertão”.

Cirilo Marcos

Para mais informações acesse a página da ALERP

Comentários

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo
Portal É Notícias